domingo, 6 de dezembro de 2009

“Os piores inconvenientes ou as piores ameaças que prometem atingir minha pessoa só adquirem sentido pelo meu projeto [...], é insensato pensar em queixar-se, pois nada alheio determinou aquilo que sentimos, vivemos ou somos.”
“Tal responsabilidade absoluta não é resignação: é simples reivindicação lógica das consequências de nossa liberdade. O que acontece comigo acontece por mim [através de mim, passando por mim], e eu não poderia me deixar afetar por isso, nem me revoltar, nem me resignar. [...] Tudo o que acontece comigo é, de algum modo, meu.”

Jean-Paul Sartre, em “O Ser e o Nada

sábado, 5 de dezembro de 2009

Como pode, no silêncio, tudo se explicar?!

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                  Fluência

 
Entristece perceber a facilidade
Com que alguns dizem do amar
 
Mais ainda ver
Aqueles que não estão mais por aqui
Usarem da mesma desenvoltura para o dizer às outras
 
Reconfortante seria saber
Da veracidade desses amores

Mas percebo novamente a jogatina
Quando me ocorrem as suas futilidades ditas
 
Se verdade saberia da aptidão inata
Daquele para "o sentir"
Mas da negativa só concluo
Que pra Tudo que foi destinado
 
Nem merecimento houvera

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quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

. . . desfile . . . combate . . . enterro. . .


---PatchworK---

Pudera eu compartilhar o simbolismo de cada palavra
Divisão equivalente dos ---patch--- de minha estada distraída.
Pena! Que algumas palavras voam pássaros e pousam pedras.
E de tão abstrata minha alma se consome.

Mesmo assim, insisto sempre!
Não faria melhor outra coisa
Que a colcha da minha existência equilibrada em ---types---
Que talvez só eu mesma decifre.

E não me iludo!
As palavras só terminam em quem aterrisam.
Feliz! Que, por vezes, alguns mais atentos me desvendam.

Mas também não me desaponto! Se outros de tão absortos!
Reorganizam o que eu achava ser a melhor ordem de mim.
Fazer o quê?! São ---other collages---

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Lado a lado com a espécie humana corra outra raça de seres, os inumanos, a raça dos artistas que, incitados por desconhecidos impulsos, tomam a massa sem vida da humanidade e, pela febre e pelo fermento com que a impregnam, transformam a massa úmida em pão, e o pão em vinho, e o vinho em canção. Do composto morto e da escória inerte criam uma canção que contagia. Vejo esta outra raça de indivíduos esquadrinhando o universo, virando tudo de cabeça para baixo, os pés sempre se movendo em sangue e lágrimas, as mãos sempre vazias, sempre se estendendo na tentativa de agarrar o além, o deus inatingível: matando tudo ao seu alcance que lhe rói as entranhas (...) Um homem que pertence a essa raça precisa ficar em pé no lugar alto, com palavras desconexas na boca, e arrancar as próprias entranhas. É certo e justo, porque ele precisa! E tudo quanto fique aquém dessa aterrorizador espetáculo, tudo quanto seja menos sobressaltante, menos tetrificante, menos louco, menos delirante, menos contagiante, não é arte. O resto é falsificação. O resto é humano. O resto pertence à vida e à ausencia de vida.

Henry Miller
Hino ao crítico

Da paixão de um cocheiro e de uma lavadeira
Tagarela, nasceu um rebento raquítico.
Filho não é bagulho, não se atira na lixeira.
A mãe chorou e o batizou: crítico.

O pai, recordando sua progenitura,
Vivia a contestar os maternais direitos.
Com tais boas maneiras e tal compostura
Defendia o menino do pendor à sarjeta.

Assim como o vigia cantava a cozinheira,
A mãe cantava, a lavar calça e calção.
Dela o garoto herdou o cheiro de sujeira
E a arte de penetrar fácil e sem sabão.

Quando cresceu, do tamanho de um bastão,
Sardas na cara como um prato de cogumelos,
Lançaram-no, com um leve golpe de joelho,
À rua, para tornar-se um cidadão.

Será preciso muito para ele sair da fralda?
Um pedaço de pano, calças e um embornal.
Com o nariz grácil como um vintém por lauda
Ele cheirou o céu afável do jornal.

E em certa propriedade um certo magnata
Ouviu uma batida suavíssima na aldrava,
E logo o crítico, da teta das palavras
Ordenhou as calças, o pão e uma gravata.

Já vestido e calçado, é fácil fazer pouco
Dos jogos rebuscados dos jovens que pesquisam,
E pensar: quanto a estes, ao menos, é preciso
Mordiscar-lhes de leve os tornozelos loucos.

Mas se se infiltra na rede jornalística
Algo sobre a grandeza de Puchkin ou Dante,
Parece que apodrece ante a nossa vista
Um enorme lacaio, balofo e bajulante.

Quando, por fim, no jubileu do centenário,
Acordares em meio ao fumo funerário,
Verás brilhar na cigarreira-souvenir o
Seu nome em caixa alta, mais alvo do que um lírio.

Escritores, há muitos. Juntem um milhar.
E ergamos em Nice um asilo para os críticos.
Vocês pensam que é mole viver a enxaguar
A nossa roupa branca nos artigos?


Vladimir Maiakóvski

(Tradução de Augusto de Campos e Boris Schnaiderman)

Alguns pressentem a chuva; outros contentam-se em molhar-se.

Henry Miller
Maiakovski

Não acabarão com o amor,
nem as rusgas,
nem a distância.
Está provado,
pensado
verificado.
Aqui levanto solene
minha estrofe de mil dedos
e faço o juramento:
Amo
firme
fiel
e verdadeiramente.

O Bom Veneno

Nina Becker

o bom veneno é amargo
e os melhores vem em pequenos frascos
o bom veneno é rascante
seu ventre queima, seus dentes rangem
o bom veneno deve ser assim
e eu te peço: sirva uma dose desses para mim

pois o começo é sempre ligado ao fim
de algo bom ou de algo ruim
e o meu fim será seu suplício
pra eu poder voltar ao início

o bom veneno traz a morte certa
sem deixar rastro, sem deixar provas
o bom veneno é um drinque
se faz um brinde, se comemora
o bom veneno deve ser assim
e eu te peço: sirva uma dose desses para mim

pois o começo é sempre ligado ao fim
de algo bom ou de algo ruim
e o meu fim será seu suplício
pra eu poder voltar ao início

o bom veneno traz a morte certa
sem deixar rastro, sem deixar provas
o bom veneno é um drinque
se faz um brinde, se comemora
o bom veneno deve ser assim
e eu te peço: sirva uma dose desses para mim

pois o começo é sempre ligado ao fim
de algo bom ou de algo ruim
e o meu fim será seu suplício
pra eu poder voltar ao começo

é sempre ligado ao fim
de algo bom ou de algo ruim
e o meu fim será seu suplício
pra eu poder voltar ao início